terça-feira, 24 de novembro de 2015

Legião Urbana

Brasília, meados de 1978, princípio do processo de abertura política que colocou término na ditadura militar. Aos 16 anos, Felipe Lemos, filho de um professor da Universidade de Brasília, retornara da Inglaterra com os pais para residir num conjunto de quatro edifícios com paisagem para o Lago Norte, designado de Colina. Os apartamentos eram amplos e serviam de casa para os professores.
Numa noite, uns amigos levaram Fê a uma festa onde o som tocava canções do Sex Pistols, Ramones e The Clash. Esperando descobrir quem era o possuidor dos discos, Fê foi apresentado a um cara diferente, que usava camisa social e andava segurando uma capanga numa mão e um guarda-chuva na outra. Era Renato Russo, que logo estava enturmado na Colina, aonde viria a se constituir o maior núcleo dos grupos de Brasília.
Renato Russo respirava música. Seu quarto era um festival com mais de 500 pôsteres. Tinha tanta coisa pra ver que quem entrava ficava horas olhando pras paredes. Havia também uma enorme quantidade de discos e livros e um aparelho de som com quatro caixas. Renato era do tipo aglutinador. Ligava para todos da turma, marcava as reuniões, tinha opiniões para atividades em grupo e quando começava a falar era complicado terminar. Muito bem informado, tinha uma cultura grande e gostava de projetar o futuro de sua própria existência.
Em 1978, Renato também conheceu André Pretorius, que percorria a capital com um visual punk e era filho de um diplomata na África do Sul. Pretorius e Fê haviam acertado de montar uma banda com André Muller, que estava residindo na Inglaterra. Mas Renato antecipou o ocorrido e chamou Fê e Pretorius para constituir um grupo com ele no baixo, Fê na bateira e Pretorius na guitarra.
"A gente tava na Colina sentado no chão, pensando qual seria o nome da nossa banda. Eu tava com um negócio de elétrico na cabeça e alguém falou comigo tijolo elétrico. Aí o André Pretorius falou: não, Aborto Elétrico", recorda Fê. E Renato começou a compor o repertório da banda. Estava pronta a "mãe" de todas os conjuntos musicais de Brasília.
Os ensaios do Aborto Elétrico eram na Colina. O primeiro show foi em 1980, no centro mercantil Gilberto Salomão, num bar chamado Só Cana, e foi instrumental pois Renato não cantava. Foi o primeiro e único show do Aborto Elétrico com Pretorius na guitarra. Ele foi para a África do Sul chamado pelas forças armadas de lá, envolvidas na manutenção do Apartheid. Alguns anos mais tarde, em entrevista à Sônia Maia na revista Bizz, Renato disse que o Aborto Elétrico acabou virtualmente quando Pretorius foi para a África do Sul.
A seguir, outras pessoas nos calços do Aborto Elétrico, montariam grupos, explodindo o fenômeno do rock de Brasília. Flávio Lemos, irmão de Fê o substituiu no baixo e Renato assumiu a guitarra. Os ensaios ocorriam na nova casa de Fê e Flávio no Lago Norte. Essa alteração do local dos ensaios para o Lago Norte, também determina o início do término da turma da Colina.
Renato sempre chegava com idéias de letras raivosas e radicais nos acordes de sua guitarra, falando até de morte. Renato era um catalisador de angústias na sua poesia, apesar de ser terno e afetuoso no cotidiano. Ainda em 1980, Pretorius retornou para férias em Brasília e participou de ensaios importantes para concepção de "Música Urbana", "Que País É Este", "Veraneio Vascaína" e "Conexão Amazônica", todas canções que teriam grande impacto no rock brasileiro. Em 1985, contudo André Pretorius faleceu de overdose nos Estados Unidos.
O auge do Aborto Elétrico aconteceu em 1981. Foram vários shows com outras novas bandas de Brasília, todas originárias de alguma forma da Colina. No meio do ano Ico Ouro Preto assumiu a guitarra do Aborto Elétrico e Renato passou a se ocupar apenas dos vocais. O cantor, compositor e ex-guitarrista do Aborto Elétrico, Renato Russo, vivia falando de como seria sua carreira numa banda de rock. O grupo estava em plena atividade nas festinhas, nos colégios, e em festas de aniversário. Mas para Renato era pouco.
O fim do Aborto Elétrico aconteceu em março de 1982. Na BIZZ, ainda falando à Sônia Maia, Renato disse que o grupo terminou numa briga por causa da música "Química", um dos primeiros clássicos da Legião Urbana. Segundo Renato, Fê lhe disse que "Química" era muito ruim e o acusou de ter perdido o jeito de fazer música. Renato respondeu que Fê só queria ficar fazendo camiseta e pediu o boné. Fê Lemos concorda que foi esse o momento de ruptura, mas o clima entre os dois não estava bom já havia algum tempo.
Aconteceram outras brigas entre Fê e Renato. Uma delas foi no primeiro aniversário da morte de John Lennon, um dos grandes ídolos de Renato. "Fomos fazer um show numa cidade satélite e o Renato tava super sentido. Eu fiquei com ciúmes. Quando ele errou uma música, atirei uma baqueta nele e acertei na cabeça. Ele me olhou com uma cara horrível e sumiu depois do show. Aí saquei o que eu tinha feito. Fui pra casa dele e só faltou me jogar aos seus pés. Era uma amizade muito forte, tinha um quê de mágico, porque nos conhecemos através dos discos de punks".
Renato Russo e Fê Lemos tinham 22 e 20 anos, respectivamente. Até aquele momento eram os principais líderes da turma de Brasília, os fundadores do Aborto Elétrico, a primeira banda punk da cidade, os aglutinadores do movimento. Mas o fim do Aborto Elétrico mudou destinos e separou os amigos em banda diferentes. Mesmo sem Renato Russo, Fê tentou manter o Aborto Elétrico. Afinal, eles já tinham uma certa fama no circuito alternativo de Brasília. Como numa despedida oficial, Fê chamou Renato para uma última apresentação com o grupo. Renato foi e o Aborto Elétrico teve a sua derradeira aparição. Seis meses depois Fê foi convidado para entrar no Capital Inicial. Flávio foi com ele.
Era 1982 e a semente lançada em Brasília pelo Aborto Elétrico havia gerado muitos frutos em forma de bandas de punk rock. Com o fim do Aborto Elétrico, Renato intitulou-se O Trovador Solitário e, com um violão, tocava abrindo shows de outros grupos locais e apresentando novas composições, como "Faroeste Caboclo". Mas Renato não queria seguir sozinho. Ele achava que era importante ter uma banda no mundo do rock.
Nesse mesmo ano, Renato formou a Legião Urbana que permaneceu ativa de 1982 a 1996. Ela se tornou um dos maiores sucessos musicais do país, somando um total de mais de 15 milhões de discos vendidos. Até hoje, a Legião Urbana é a banda de rock brasileira que mais vendeu, sendo a única que ainda possui todos os seus discos em catálogo à venda. O estrondoso sucesso mesmo depois do fim da banda aliado ao culto ao seu líder, Renato Russo, só fez aumentar o mito em torno dela.
Formada no início dos anos 80 após a dissolução do Aborto Elétrico, tinha como principal figura, o vocalista Renato Manfredini Júnior, o Renato Russo (1960-1996), que foi o mentor da banda junto com o baterista Marcelo Bonfá. O primeiro show da Legião Urbana aconteceu no dia 05 de setembro de 1982 na cidade mineira de Patos de Minas, e esse foi o único show em que a banda apareceu com a sua primeira formação, que tinha: Renato Russo (vocalista e baixista), Marcelo Bonfá (baterista), Paulo Paulista (tecladista) e Eduardo Paraná (guitarrista).
A banda foi uma dos nove atrações do festival Rock no parque, realizado na cidade de Patos de Minas em 05 de setembro de 1982.Na verdade, a Cadoro Promoções - empresa responsável pela produção do festival - tinha contratado o Aborto Elétrico e até impresso centenas de cartazes com o nome da band formada por Renato Russo, Fê Lemos e André Pretorius. Mas como o grupo tinha acabado, Renato convenceu o dono da produtora, Carlos Alberto Xaulim, a se apresentar com banda que tinha acabado de formar com o baterista Marcelo Bonfá.
Após este show, Paulo Paulista e Eduardo Paraná deixam a Legião Urbana. O próximo guitarrista seria Ico Ouro-Preto, mas é logo substituído por Dado Villa-Lobos, que assume a guitarra da Legião em março de 1983. Observação: Ao contrário do que muitos dizem, o guitarrista André Pretorius nunca tocou na Legião Urbana, ele só fez parte da banda Aborto Elétrico.
No dia 23 de julho de 1983, a Legião faz no Circo Voador, Rio de Janeiro, um show que mudaria a história da banda. Após a apresentação a banda é convidada a gravar uma fita demo com a EMI.
Em 1984 começa a gravação do primeiro disco, que foi lançado no dia 1° de Janeiro de 1985. O baixista Renato Rocha, amigo de Marcelo Bonfá, tocou com o trio nos três primeiros álbuns, mas deixou a banda devido a desentendimentos com os outros membros.
Lançado no dia 1º de janeiro de 1985, pela EMI, o primeiro álbum da banda: Legião Urbana, é extremamente politizado, com letras que fazem críticas contundentes a diversos aspectos da sociedade brasileira. Paralelamente, possui canções de amor que foram marcantes na história da música brasileira, como "Será", "Ainda é cedo", “Geração Coca-Cola” e "Por Enquanto", que é considerada como sendo "a melhor faixa de encerramento de um disco".
Foi lançado em 1986, o álbum: Dois. É o segundo album mais vendido da banda, com mais de 1,2 milhões de cópias. Esse disco é um dos mais importantes da história do rock brasileiro. As principais músicas do disco são: ”Quase sem querer”, “Eduardo e Mônica”, “Tempo perdido” e “Índios”.
O terceiro e importante disco do Legião Urbana: Que país é este chega às lojas. Das nove canções do disco, sete eram do antigo Aborto Elétrico. Este é o album mais punk da Legião Urbana e contém em seu encarte, uma breve história da banda. Foi o último trabalho com a participação do então baixista Renato Rocha. Alguns hits da obra são: “Que país é esse?”, “Química”, “Eu sei”, “Faroeste Caboclo” ( que foi uma música que impressionou público e crítica, por ser uma música de mais de nove minutos de duração e que mesmo assim tocou bastante nas rádios) e a calma “Angra dos Reis”.
Considerado por muitos o melhor trabalho da Legião Urbana, As Quatro Estações contém o maior número de hits da banda: são 11 músicas, das quais pelo menos 9 foram tocadas incessantemente nas rádios. Algumas músicas de destaque são: “Pais e filhos”, “Há tempos” e “Meninos e meninas”. É o álbum mais vendido da Legião, vendeu mais de 1,7 milhoes de cópias e é considerado o disco mais "religioso" da banda.
Lançado em Novembro de 1991, V é o disco mais melancólico da Legião Urbana; talvez, só A Tempestade se equivala a ele nesse aspecto. Renato estava em um momento complicado de sua vida, com a descoberta de que era soropositivo um ano e meio antes e o alcoolismo. V é recheado de canções atípicas para os padrões da banda como por exemplo, a atmosférica "Metal Contra As Nuvens", com seus mais de 11 minutos de duração, a densa "A Montanha Mágica", a crítica social de "O Teatro dos Vampiros" e a depressão de "Vento No Litoral". Para boa parte dos fãs mais fervorosos, esta é a obra-prima da Legião Urbana.
O álbum: O descobrimento do Brasil é de 1993, época em que Renato Russo tinha iniciado o tratamento para livrar-se da dependência química e mostrava-se otimista quanto ao seu sucesso. Ainda assim, as letras oscilam entre tristeza e alegria, encontros e despedidas. É como se, para seguir em frente, fosse necessário deixar muitas coisas para trás, e não se pudesse fazer isso sem uma boa dose de nostalgia. Desta foma, é um álbum com fortes notas de esperança, mas permeado por tristeza e saudosismo. “Perfeição” e “Giz” tocaram nas rádios.
Há quem considere este álbum: A tempestade ou o livro dos dias, lançado em 20 de setembro de 2006, o último da banda. Curiosidades: Na capa interna do disco, há um verso que diz "O Brasil é uma República Federativa cheia de árvores e gente dizendo Adeus", e na faixa “Música Ambiente” há um trecho que diz "...e quando eu for embora, não, não chore por mim...", sugerindo uma despedida antecipada. “Dezesseis” foi um sucesso do disco. Renato Russo faleceu 21 dias após o lançamento, em 11 de outubro de 1996.
O Disco póstumo da Banda: Uma outra estação traz gravações feitas do que seria o novo álbum da Banda, mas Renato Russo morreu e a EMI mesmo assim publicou essa obra, em 1997, que tem músicas completamente depressivas, expressando toda a dor quando a pessoa sabe que vai morrer. O último show da Legião Urbana aconteceu no dia 14 de janeiro de 1995, numa casa de shows chamada Reggae Night em Santos, litoral do estado de São Paulo.
O fim oficial da Legião Urbana aconteceu no dia 22 de outubro de 1996, 11 dias após a morte do mentor, líder e fundador da Legião Urbana, o cantor Renato Russo. Apesar de ter terminado há muitos anos, até hoje a Legião continua tendo muitos fãs.

Discografia

Legião Urbana (EMI, 1984)

Dois (EMI, 1986)

Que País É Este 1978/1987 (EMI, 1987)

As Quatro Estações (EMI, 1989)

V (EMI,1991)

Música Para Acampamentos (coletânea de diversas gravações ao vivo) (EMI, 1992)

O Descobrimento do Brasil (EMI, 1993)

A Tempestade ou O Livro Dos Dias (EMI, 1996)

Uma Outra Estação (EMI, 1997)

Mais do Mesmo (coletânea) (EMI, 1998)

Acústico MTV (gravado ao vivo em 1992) (EMI, 1999)

Como É Que Se Diz Eu Te Amo (gravado ao vivo em 1994) (EMI, 2001)

As Quatro Estações Ao Vivo (gravado ao vivo em 1990) (EMI, 2004)

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